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O herdeiro ao se propor manifestar sua renúncia, concedida numa ficção jurídica do princípio de saisine, traz repúdio a sua cota hereditária em um ato puro, simples e gratuito.

Em primeiro lugar é importante destacar que a renúncia, por ser um ato jurídico unilateral dentro do direito potestativo, vem acompanhada de requisitos formais tais como: ser redigida de forma expressa, utilizando de instrumentos públicos, conforme prevê o artigo 1.806, do nosso diploma civil:

Art. 1806, CC: A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial

De outro modo, o herdeiro ao se manifestar pela renúncia do seu quinhão hereditário é informado que os efeitos são ex-tunc, ou seja, é o mesmo sentido de que o renunciante nunca tivesse existido, exposto de forma translativa, o qual se propôs a se abdicar do seu direito, não se confundindo com a cessão do seu quinhão patrimonial, conforme aduz o parágrafo único, do artigo 1.804, do Código Civil:

Art. 1.804, CC, parágrafo único: A transmissão tem-se por não verificada quando o herdeiro renúncia à herança

Outrossim, o diploma civil, no seu artigo 1.812 destaca que a renúncia é irrevogável, tema já consolidado nos tribunais superiores, visto que a qualidade de herdeiro sequer possui interesse em sua nulidade, ou mesmo, anulável o negócio jurídico que integra o monte-mor partilhável do acervo patrimonial, acrescendo-se sua porção hereditária à dos outros herdeiros da mesma classe. Senão vejamos, o Recurso Especial proferido pelo Ministro Luís Felipe Salomão, da Quarta Turma do STJ, em julgamento na data de 04/ 02 /2020:

RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. RENÚNCIA À HERANÇA. ATO FORMAL E SOLENE. ESCRITURA PÚBLICA. ATO NÃO SUJEITRO À CONDIÇÃO OU TERMO. EFEITO DA RENÙNCIA.RENUNCIANTES CONSIDERADOS COMO NÃO EXISTENTES: 1. A qualidade de herdeiro legítimo ou testamentário não pode ser compulsoriamente imposta, garantindo-se ao titular da vocação hereditária o direito de abdicar ou declinar da herança por meio da renúncia expressa, preferindo conservar-se completamente estranho à sucessão. 2. Ao contrário da informalidade do ato de aceitação da herança, a renúncia exige forma expressa, cuja solenidade deve constar de instrumento público ou por termos nos autos (art. 1807), ocorrendo a sucessão como se o renunciante nunca tivesse existido, acrescendo-se sua porção hereditária à dos outros herdeiros da mesma classe. 3. A renúncia e a aceitação à herança são atos jurídicos puros não sujeitos a elementos acidentais. Essa a regra estabelecida no caput do art. 1808 do Código Civil, segundo o qual não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes, sob condição (evento futuro incerto) ou termo (evento futuro e certo).4. No caso dos autos, a renúncia operada pelos recorrentes realizou-se nos termos da legislação de regência, produzindo todos os seus efeitos: a) ocorreu após a abertura da sucessão, antes que os herdeiros aceitassem a herança, mesmo que presumidamente, nos termos do art. 1807, do CC⁄2002; b) observou-se a forma por escritura pública, c) por agentes capazes, havendo de se considerar que os efeitos advindos do ato se verificaram.5. Nessa linha, perfeita a renúncia, considera-se como se nunca tivessem existido os renunciantes, não remanescendo nenhum direito sobre o bem objeto do negócio acusado de nulo, nem sobre bem algum do patrimônio.6. Recurso especial não provido.

Um detalhe importante é que se a renúncia abdicada for realizada por procuradores, a procuração em sí deve estar revestida de poderes expressamente específico para tal ato, com registro público em razão de ser considerada herança aberta de bem imóvel.

Nesse diapasão, dá-se destaque ao artigo 1.810, do diploma civil que descreve não existir representação na renúncia, ou seja, havendo a renúncia a parte do abdicado, esta passará aos outros legítimos da mesma classe, sendo que na falta destes, assume a classe seguinte até ao 4º grau da sucessão, não podendo os sucessores manifestar de forma a recusar à renúncia, e sim, de somente acrescer o quinhão hereditário de cada contemplado.

Tomamos como exemplo, um caso concreto onde o falecido deixou um patrimônio de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), na condição de que era viúva, e teve 05 filhos, A,B,C,D,e E, sendo o correto a partilha de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para cada herdeiro legítimo, porém, o filho “C”, resolveu renunciar ao seu quinhão hereditário, e transformou maior a cota dos outros quatros filhos, cabendo a cada um o montante de R$ 125.000,00 (cento e vinte mil reais).

Como dito alhures, em destaque para o artigo 1.810, CC, e reforçado pelo Enunciado 575 da VI Jornada de Direito Civil, que em caso de haver concorrência com “herdeiros de classes diversas”, a renúncia de qualquer um deles permite que sua parte integrem a mesma ordem dos chamados a suceder.

Enunciado 575 VI Jornada de Direito Civil: com o advento do Código Civil de 2002, a ordem de vocação hereditária passou a compreender herdeiros de classes diferentes na mesma ordem, em concorrência sucessória. Alguns dispositivos do Código civil, entretanto, permanecem inalterados em comparação com a legislação anterior. É o caso do artigo 1.810, que prevê, na hipótese de renúncia, que a parte do herdeiro renunciante seja devolvida aos herdeiros da mesma classe. Em interpretação literal, v.g., concorrendo à sucessão cônjuge e filhos, em caso de renúncia de um dos filhos, sua parte seria redistribuída apenas aos filhos remanescentes, não ao cônjuge, que pertence a classe diversa. Tal interpretação, não se coaduna , com a melhor doutrina, visto que a distribuição do quinhão dos herdeiros legitimo (arts. 1.790, 1832, 1.837) não comporta exceção, devendo ser mantida mesmo no caso de renúncia.

Por outro lado, caso em que o herdeiro faça sua renúncia, agindo de má-fé, para prejudicar os credores, a legislação pátria, destaca que estes poderão assumir o lugar do herdeiro renunciante no inventário, caso em que, a cota renunciada ser maior que a dívida do fornecedor, a diferencia será acrescida aos herdeiros remanescentes, em alusão ao artigo 1.813, CC.

Por fim, não menos importante, uma vez a renúncia estar eivada de dolo ou coação, e mesmo ela sendo considerada irrevogável seu ato, é imperioso afirmar que esta poderá ser submetido a nulidade, conforme prevê a Parte Geral do Código Civil.

Edilson Vargas, é advogado especialista em inventário, partilha, planejamento sucessório, divórcio e aposentadoria. É sócio da banca Silveira & Vargas Advocacia e Consultoria, com escritório em Campo Grande e Três Lagoas (MS). Email: edilson.vargas@silveiraevargas.adv.br

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